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17/05/2010

Dexter e a psicodinâmica psicopática


Há algum tempo que amigos e alunos me enviam indicações deste seriado. Com o excesso de atividades e escassez de tempo, demorou um pouco – alguns anos – para que pudesse finalmente assistir a pelo menos um episódio.

É claro que ao longo desses quase 5 anos muita coisa deve ter mudado e tornado o seriado mais complexo. Minhas considerações são todas feitas a partir do episódio 1.01, quando somos apresentados ao protagonista e ao seu nítido quadro de psicopatia.

Nas primeiras cenas o mecanismo de CONTROLE fica bem nítido, até mesmo na forma que ataca sua primeira vítima. Rédeas que levam a uma onipotência, latente e totalmente manifesta. Nosso justiceiro tem um grande controle pulsional, da mesma forma que precisa controlar aqueles que serão objetos de satisfação desta.

É claro que há um suposto “limite”.  Crianças estão fora da sua área de atuação. Há certa lógica, mesmo que não linear, nas mais bizarras formas de satisfação pulsional. Sua ética/moral (Henry Code) foi criada pelo seu pai. Há algo de tão lacaniano nesse código, que estes psicanalistas vibrariam nos comentários.

Aprendemos ao longo do episódio que Dexter Morgan sente um vazio. Vazio esse inerente a todos nós, que nos faz sermos eternos seres de pura falta, puro desejo. Buscamos constantemente pessoas, coisas ou situações que nos preencham, mesmo que ilusoriamente. Somos eternamente insatisfeitos e é isso que nos faz humanos.

Dexter é diferente. Seu psiquismo é diferente. Amor -> culpa -> reparação -> aprendizado. Melanie Klein foi brilhante nas suas construções teóricas e posteriormente seus seguidores complementaram. Sem esse processo não há aprendizado. Alguém que NÃO SENTE, como Dexter, não terá culpa, reparação e logo, não há certo tipo de aprendizado.

Isso ainda é mostrado quando ele fala das sensações e sentimentos. Realmente ele não sente. Ele FINGE todas elas. Sensações contra-transferenciais com psicopatas são muito claras: dramatização (não histriônica), artificialidade, certo fingimento, ou, para os menos ou não treinados, quase uma perfeição. Na clássica cena da conversa com seu pai, vemos o famoso tripé psicopático e uma das suas apresentações: tortura com animais (enurese tardia + brincadeiras com fogo). Clichet do cinema e que faz jus na vida real e na literatura psiquiátrica.

Seu barco tem um nome interessante: slice of life – fatia de vida. Ao mesmo tempo que brinca com o ato de fatiar, subentende-se que o que Dexter tem não é uma vida, e sim, apenas um pequeno pedaço do que ela poderia ser.

Seu controle pulsional é tão rígido que se estende para sua vida profissional e pessoal. Seu apartamento é impecável, em uma organização que deixaria um paciente com TOC em uma eterna felicidade. Isso não o caracteriza como tal, mas nos mostra a rigidez com qual tem que lidar com objetos externos, para controle das suas pulsões (internas).

Sua sexualidade, claramente, não tem como ser tão resolvida. Genitalidade é algo que está longe para este Ego. Ato tão primitivo e tão desligado de qualquer prazer pulsional. É claro que seu prazer está na satisfação perversa que consegue com seus objetos anulados – assassinatos – e pensar no ato sexual em si é algo que remete a rejeição. Sua libido está deslocada e não passa pela sua genitalidade.

Sua fixação por sangue talvez nos traga mais informações sobre sua psicodinâmica, em episódios futuros, porém não há como não fazer relação com uma situação quase vampiresca, onde o incontrolável precisa ser controlado.  Em conversa com seu pai, falam sobre natureza, desejo, algo inerente a ele, como se essas pulsões perversas fossem ocasionadas por uma trauma organizador precoce, muito semelhante as descrições limítrofes feitas por Bergeret. Um também clichet no senso comum.

Seu pai cria um código de conduta, uma vez que o Édipo falhou no processo de formação superegóico. Um pai “externo” que cria um superego externo, que precisa ser seguido quase que obsessivamente. Nada mais freudo-kleiniano. A situação apresentada, onde nosso vilão é  herói,  ou super herói justiceiro, dá indícios de uma possível resolução de um quadro pulsional impossível de se trabalhar numa esfera clínica. Há consenso teórico de que a psicopatia é um transtorno difícil e complexo de se trabalhar, sendo o cárcere uma das saídas mais seguras nos dias de hoje.  Infelizmente na vida real não temos como ter justiceiros como Dexter.  Nem mesmo controles pulsionais tão rígidos que passem assim pela racionalidade....

1 comentários:

Cristiane disse...

Edu, eu adoro Dexter. A primeira temporada é bastante sanguinária e até clichê. Na terceira e na quarta ele parece se humanizar levemente, o que provavelmente, seja algo impossível na realidade das psicopatias...
Adorei o post e adorei vc começar a ver... Continua, continua!

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